21/06/2017

A Globalização do Direito

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

A crescente internacionalização do Direito e de sua aplicação é em grande parte responsável pelos acontecimentos que repercutem na política nacional. A Operação Lava a Jato, por exemplo, não existiria sem a Anti-Corruption Act, a Anti-Terrorism Act, e outros tratados permitindo a delação premiada e os acordos de leniência. É baseado neles que o Ministério Público e a Justiça Federal têm proposto ações e decidido pela punição dos envolvidos em esquemas de corrupção.

O crime organizado, a corrupção globalizou-se, e a justiça acompanhou a tendência irreversível. Na esteira dessa judicialização os americanos puniram os larápios da Fifa, os argentinos os fundos abutres, e agora, o Brasil sanciona os predadores da Petrobras e das empreiteiras contratadas. O juiz Sérgio Moro quedaria inerte não fora a legislação que permite tanto quanto ao Ministério Público e a Polícia Federal o cometimento desses atos administrativos e jurisdicionais.

As assacadas contra o Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal. As acusações de Estado policial e ditadura judicial, são improcedentes. Tudo vem se fazendo dentro dos ditames da Lei. Não se quer com isso dizer que não tenham ocorridos erros de interpretação e consequentes abusos.

O sistema recursal brasileiro é extremamente permissivo, e irá possibilitar a correção das disfunções e equívocos cometidos quando da aplicação da legislação, fruto da internacionalização do Direito e de sua aplicação.

O Brasil tem empresas como a Embraer, a JBS, as próprias construtoras, operando mundialmente, a sua capacidade de corromper, em parceria com os agentes do Estado, se estende a vários países. Tão logo os ministérios públicos, policias e judiciários nacionais tomem conhecimento dessas infrações, é seu dever agir e colaborar com os países de origem, em nome da reciprocidade dos tratados.

Os irmãos Batista, controladores da JBS, praticaram vários atos de corrupção nos Estados Unidos, e vêm negociando com o Judiciário daquele país a delação e o pagamento de multas. Os ajustes que lá fizerem e as provas produzidas serão intercambiadas com a autoridades brasileiras e vice-versa.

É assim que se procede na judicialização internacional de combate à corrupção deletéria para a economia de todos os países, por desviar dinheiro que seria empregado em programas sociais de educação, alimentação e saúde.

O Papa Francisco em recente alocução sobre o mal de corrupção, afirmou que não são cristãos, embora compareçam a atos litúrgicos, autoridades e empresários envolvidos em desvios de recursos a serem aplicados em políticas de Estado que beneficiariam sobretudo os mais pobres.

Quando do julgamento da representação de abuso do poder econômico no Tribunal Superior Eleitoral-TSE, o relator Hermann Benjamin teceu considerações sobre sistemas jurídicos, sendo nossa filiação ao romano-germânico, enquanto os americanos situam-se no common-law. Acentuou sua irrelevância face a contribuição entre os sistemas e a crescente globalização do Direito.

Daí advindo consequências práticas para os envolvidos, a exemplo do intercâmbio de provas robustas, concorrentes a sua penalização. Os recursos tecnológicos atualmente disponíveis podem contribuir para produção de acervo documental determinante ao sancionamento dos culpados.

  Lá pelos idos de 1996, realizou-se em São Paulo, o II Seminário sobre a Independência Judicial na América Latina, aprovando-se, na ocasião, as conclusões seguintes: a) os Direitos Humanos devem ser defendidos através da prevalência dos pactos internacionais acima de qualquer norma interna do ordenamento jurídico; b) a submissão de todo os sistemas jurisdicionais dos países à Corte de Direitos Humanos, sediada em San José da Costa Rica e à Corte Internacional de Justiça da Organização das Nações Unidas-ONU; c) a obrigatoriedade dos países assinarem os pactos internacionais, aplicando-os em seus territórios; d) a liberdade de expressão e associação dos juízes.

Recordo que à época, embora concordando com o sonho de um mundo governado pelo Direito, como desejavam Kant e Kelsen, chamei a atenção para as armadilhas do internacionalismo. Em texto inserido no livro “A Reinvenção do Judiciário”, propugnei pela independência cultural e jurídica dos países signatários.

Decorridos tantos anos, é forçoso reconhecer que a tese permanece de pé, sem deixar de admitir: o processo de globalização do Direito é inexorável.

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