01/06/2017

A Natureza da Crise

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Em entrevista à “Folha de São Paulo” da última segunda-feira, o Ministro da Justiça, Torquato Jardim, assegurou que a presente crise não é política, mas econômica, e que aprovadas as reformas em curso no Congresso Nacional, ela será superada. Não partilho do mesmo otimismo do ilustre eleitoralista, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral, que honrosamente integro. A atual conjuntura envolve dimensões estruturais a exigir avaliações e propostas de soluções de parte não apenas dos estamentos estatais, isto é, do Executivo, Legislativo e Judiciário.

Requer pronunciamentos da sociedade brasileira, de suas lideranças, manifestado que está o Insurgente inconformismo com o tipo de Estado que temos, com os serviços prestados à população, expresso pelas multidões ocupantes de praças e ruas desde 2013, sem que a chamada classe política lhes dê ouvidos.

Há necessidade de refazer-se o pacto político com as correspondentes alterações no modelo jurídico adotado. O procedimento poderá ser pela revisão constitucional, com a consequente reforma da Lei Fundamental, ou mesmo a convocação de Assembleia Constituinte para a elaboração integral de novo texto.

A parceria da Presidência com o Congresso Nacional não será suficiente para garantir a governabilidade e o pleno funcionamento das instituições republicanas. A instância legislativa carece de legitimidade, gerada pelos meios como se elegeram deputados e senadores da presente legislatura. Sem falar do déficit de credibilidade do Chefe do Poder Executivo envolvido em ações da Operação Lava Jato.

No momento, o magno tema da discussão pública é a reforma política e eleitoral. A partir dela se formalizarão as regras dos pleitos de 2018, escoimadas dos maiores vícios contaminadores da nossa representação política.

Em evento recente realizado pela Associação dos Advogados de São Paulo-AASP, nos dias de 25 a 27 de maio, em Ribeirão Preto, enfatizei para a direção da entidade, em particular para o seu vice-presidente Luiz Périssé, a conveniência e oportunidade de deflagrar-se debate nacional sobre a Reforma Política e Eleitoral, envolvendo organizações representativas da sociedade civil comprometidas com o futuro do Estado Democrático de Direito, incluindo a Ordem dos Advogados do Brasil.

 O prazo de efetivar alterações sobre a matéria envolvendo a Constituição Federal e a legislação complementar e ordinária sobre a matéria esgota-se em setembro próximo, urgindo que se inicie a discussão de imediato, alterando-se em seguida as regras do jogo das eleições para Presidente, governadores, deputados e senadores, a realizar-se sob novas bases, fora do quadro atual de domínio quase absoluto do poder econômico e administrativo.

A forma e as normas de elegibilidade dos atuais governantes determinam os procedimentos por eles adotados na esfera pública e nas suas tratativas contratuais com os empresários. Pauta-se tudo pela regra do “negócio entre amigos”, privatiza-se o que é do estrito interesse público.

O Presidente da República, professor de Direito Constitucional, em texto analítico sobre as manifestações de rua, a respeito da má qualidade dos serviços públicos e do combate à corrupção, mencionou ser a eficiência um dos requisitos das modernas democracias. Só não mencionou os modos operacionais de executá-los.

Antes de tudo, a busca da eficiência pressupõe a adoção de modelo de Estado com a prestação qualitativa dos serviços essenciais de segurança, saúde, educação, e outros que possam constar do pacto político. A opção pela socialdemocracia de pós-Segunda Grande Guerra Mundial envelheceu, fala-se agora de liberalismo social, com a renúncia pelo Estado da proteção trabalhista e previdenciária. É o fundamento das reformas em tramitação no Congresso Nacional.

O historiador José Murilo de Carvalho, professor e pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro, membro da Academia Brasileira de Letras, sustenta a tese de que historicamente as nossas elites políticas pensam e agem pela implantação de uma democracia sem povo. Quer dizer, o regime é para servir aos iguais entre si, mas a população fica de fora. Cabe-lhe apenas o pagamento dos impostos.

É a raiz principal da crise. Essencialmente política, possui componentes econômicas e financeiras, tanto internacionais quanto nacionais. A sua natureza é hibrida, como serão múltiplas as alternativas de soluções. 

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