30/07/2017

IMPESSOALIDADE E DISCRIÇÃO

Autor: Luis Augusto Guterres Conselheiro Federal da OAB/MA

“A discrição é a perfeição da razão.”
Scott, Walter.

No inicio deste mês, os procuradores da República que trabalham na operação “Lava Jato”, em Curitiba, fizeram uma noite de autógrafos em uma terça-feira (4/7), na capital paranaense: “Venha conhecer pessoalmente os procuradores da Lava Jato em Curitiba e ficar por dentro do que está acontecendo na operação”, o procurador, chefe da força-tarefa do Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol, convocou o público em seu perfil no Face-book.E acrescentou: “Chame seus amigos de Curitiba.”O evento foi patrocinado pela APAE de Curitiba e o ingresso custou R$ 80, com renda revertida para a instituição.

Em que pese o anunciado caráter filantrópico dado ao evento promovido pelos procuradores federais, o ato de exposição daqueles funcionários públicos fere dispositivo da nossa Constituição (artigo 37) que impõe à administração pública, direta e indireta, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a obediência ao princípio de impessoalidade.


Ainda, no decorrer deste mesmo mês, sexta-feira (23), a Corregedoria Nacional do Ministério Público encaminhou à Corregedoria-Geral do Ministério Público Federal cópia da reclamação disciplinar instaurada para apurar a conduta do já citado procurador Deltan Dallagnol, na sua condição especial de coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato no Paraná. Ele será investigado por, supostamente, haver comercializado palestras que proferiu no ano passado. Os autores do pedido afirmam que Dallagnol está usando as investigações da Lava Jato para enriquecimento pessoal.


Foi apurado que o montante já recebido pelo procurador por participação em eventos atinge R$ 219.000,00; uma das últimas apresentações do procurador federal foi realizada na capital paulista e patrocinada por conhecida empresa corretora de valores em associação a uma das maiores instituições bancárias do Brasil. De resto, vale ressaltar que aproximações entre servidores públicos e gigantes do capitalismo não é uma prática que possa ser considerada salutar para a preservação do ente público.


O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, já criticou a forma como o Ministério Público Federal vem apresentando denúncias contra as pessoas no âmbito da Operação Lava Jato, em saguão de hotéis de luxo com cerimonial de marketing. “O processo é formal e guarda ritos. Não pode ser objeto de um espetáculo. Isso me preocupa. É preciso aprimorar esse procedimento”, disse o presidente nacional, que também cobra do procurador Deltan Dallagnol a divulgaçãodos nomes dos que o contrataram para palestras. “A sociedade tem o direito de saber quem são e quanto ele recebe por elas", diz Lamachia.


Toda a publicidade de atos da administração púbica deve visar à divulgação de serviços efetivamente prestados por órgãos ou entidades, sempre atendendo ao interesse público, jamais a promoção pessoal dos seus agentes ou dirigentes, pois estes devem ser, apenas, instrumentos da realização dos atos e serviços públicos. Isto, ainda que se considere que os membros do ministério público, promotores ou procuradores, não estejam enquadrados como meros servidores ou funcionários públicos, uma vez legalmente alçados ao patamar de agentes políticos. Esse tratamento não os imuniza nem exclui da submissão às regras gerais determinadas pela constituição no capitulo do serviço público.


O combate à corrupção também é bandeira da Ordem dos Advogados do Brasil. Esta entidade, ao longo de 85 anos, tem sido sentinela vigilante e de porta voz da sociedade civil brasileira na realização do Estado Democrático de Direito. Sempre na linha de frente, a OAB pauta sua atuação em defesa na ética na política e no trato do patrimônio público. Nesse mister, e inclusive no âmbito da Operação Lava Jato, já requereu à presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) a instalação imediata de uma força-tarefa, mediante a convocação de mais juízes auxiliares, para agilizar a fase de coleta de provas dos processos em curso.


A atuação de servidores públicos e, em particular, dos operadores do direito, das mais diversas áreas, em especial do Judiciário, do Ministério Público e da Advocacia, devem ser conduzidas com respeito absoluto ao principio da impessoalidade pelos dois primeiros segmentos citados, e com estrita discrição pelos advogados, estes últimos, também submetidos ao seu próprio código de ética e disciplina que elenca a discrição como preceito fundamental para a preservação dos valores tradicionais da profissão.

Publicado na edição de hoje (30/07/17, domingo), do jornal O IMPARCIAL.

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