10/07/2017

O Brasil no Precipício?

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

O economista Delfim Netto reúne currículo invejável, além da larga experiência na vida pública. Ocupou os ministérios da Fazenda, do Planejamento, da Agricultura, durante os governos do ciclo militar. Considerado um dos responsáveis pelo “milagre econômico” dos anos setenta do século passado, foi precedido por Roberto Campos e Gouvêa de Bulhões, a dupla condutora da austeridade do governo Castelo Branco, que preparou o terreno para os anos de crescimento que se seguiram, de Costa e Silva a Geisel. No governo deste último, ganhou o exilio dourado da embaixada do Brasil na França, por notórias divergências em relação à condução dos negócios nas pastas do Planejamento e da Fazenda durante o período.

De todos os títulos envergados, orgulha-se da condição de professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo. Como homem de pensamento produziu trabalhos teóricos relevantes, sendo sempre consultado para prestar consultorias a órgãos públicos e privados. Aos 89 anos, às vésperas de ser nonagenário, pode dar-se ao luxo de falar sua verdade, nem sempre respeitada por pessoas das áreas da economia, da política, e afins. Dele diverge-se sem deixar de tributar-lhe o devido respeito pela inegável inteligência.

Pode-se até mesmo afirmar, como os bons vinhos, com o passar do tempo, ficam melhores os seus lampejos de lógica em um país em que sempre esta prevalece ao lado do bom senso. Vem sustentando que ao contrário do que pensam muitos, os recursos públicos são limitados e as demandas da população ilimitadas. Logo, qualquer discurso político minimamente sério deve levar esses dois polos da equação do orçamento do Estado.

Nos velhos tempos da ditadura costumava assemelhar o mercado a um filme de faroeste em que o os empresários travavam duelos, cabendo ao agente estatal o papel de xerife, em outras palavras, o encarregado de pôr em ordem os excessos e arbítrios dos contendores do setor privado.

Naquele contexto, o Estado estava capturado pela tecnoburocracia representante dos interesses capitalistas aliados aos estamentos militares. Economistas como ele encarregavam-se de exercer essas tarefas. Em seguida, veio o Estado Democrático de Direito, que adotou a economia social de mercado, nessa ótica, este deve ser instrumento para a execução das políticas públicas. A razão é simples, o mercado é o modo mais eficiente de produzir os excedentes que serão divididos pelos métodos da justiça social.

Sobre a Lava Jato, elogiando-a como ponto de inflexão, atribui as mazelas por ela apuradas ao incesto havido entre o setor privado e o Congresso. Cooptado pelos empresários, permitiu que o poder econômico se apropriasse do poder político, o responsável pelo controle e a educação do capitalismo, outrora exercitado pelos xerifes da burocracia estatal.

Não são apenas os 30 partidos e a revogação da cláusula de barreira pelo Supremo Tribunal Federal, os responsáveis pelos vícios do sistema político brasileiro, também o financiamento das campanhas eleitorais, possibilitando o desfiguramento total da representação congressual, transformando os parlamentos em balcões de negócios, fugindo por completo às suas finalidades e funções.

A Constituição de 88, tão criticada por Delfim no passado, e agora reconhecida, dá as saídas para os impasses vividos pelo poder público. Elas estão na reforma política que os políticos vêm protelando em detrimento da sociedade e dos próprios interesses. Por disposição constitucional, ela deverá estar pronta e promulgada quando mês de setembro chegar, sob pena de inviabilizar-se.  E aí, todos sabem, as mazelas investigadas pela Lava Jato se repetirão. Com o mesmo roteiro, só mudarão os atores.

A questão do realinhamento dos poderes do Estado começa pela reforma da política e do Estado. Há caminhos constitucionais para isso. É preciso que a sociedade comece a se manifestar ocupando ruas e praças para que o Congresso se mexa. Na última entrevista, Delfim, perguntado se o Brasil estava à beira do precipício, respondeu: “ o Brasil é maior que o abismo”.

Boa resposta. Independentemente de posições ideológicas, convém reconhecer, o Brasil precisa de um mínimo de patriotismo de parte dos homens públicos.

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