29/05/2018

O CAMINHÃO BRASILEIRO

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Os caminhos do desenvolvimento nacional, fincados em meados dos anos cinquenta do século passado, se fizeram pela malha rodoviária, construída nos anos do presidente Juscelino Kubitscheck- JK como era então conhecido. Antes de assumir, em janeiro de 1956, encetou viagem pelos países da Europa, visitou as indústrias automobilísticas da Alemanha, Itália, França. Outros contatos com fábricas norte-americanas visavam incentivá-las a vir produzir no Brasil.

O Plano de Metas de JK, pretendia realizar cinquenta anos em cinco. Dotar o país de capacidade energética, de boas estradas. Objetivava acentuar o processo de industrialização, a meta síntese, a construção de Brasília, no Planalto Central, era o polo de referência do grande plano rodoviário nacional.  Juscelino ao deixar a Presidência em 1960, o Brasil era mais industrializado, a capital transferida para Brasília. Cresceram os conglomerados urbanos, o custo de Brasília fora elevado, a inflação era vertiginosa. As acusações de corrupção se repetiam de parte da oposição.

Houve inegável processo de substituição das importações, e os fabricantes de automóveis instalaram suas montadoras, e depois passaram a produzir peças aqui mesmo. Enfim, tínhamos o carro brasileiro. Àquela época economistas de peso chamavam a atenção para o descuido em relação aos transportes ferroviário, marítimo, hidroviário. Eram modalidades de transporte de custo mais baixo para os produtores, vendedores e consumidores.

Ninguém ligou para as contraditas da dependência que se fizera em relação ao transporte rodoviário. Todo o desenvolvimento industrial relacionava-se a produção automobilística. Vieram os anos autoritários e a escrita perdurou, construindo-se megasrodovias como a Transamazônica.  Restabelecido o Estado de Direito, prosseguiu-se adotando a mesma lógica. Com o agravante do sucateamento dos portos, das estradas ferroviárias, algumas delas extintas.

Semana passada deu-se o que deveria ser esperado. As empresas de transporte rodoviário, os caminhoneiros autônomos, paralisaram o país com uma greve, para muitos um locaute, com reflexos em todo o sistema econômico: desabastecimento de combustível, de gêneros alimentícios, paralização parcial do funcionamento da saúde e da segurança públicas.

Porque deveria ser esperado? Era sabido que o valor dos fretes cobrados não se compatibilizava com os custos: preço do óleo diesel constantemente reajustado aos preços do mercado internacional, sujeitos a oscilação do dólar. Além de outros encargos referentes a pedágios e cobrança de impostos. Além disso, para complicar, ocorria o excesso de oferta de transportadores, beneficiados pelo crédito fácil para a aquisição de veículos.

Para reforçar o argumento da previsibilidade, no governo anterior, ocorreu semelhante paralização, sem, contudo, atingir as proporções agora alcançadas. Dentre outras razões, pela agudização das causas sem que se apresentasse as possíveis soluções.

Há aproveitadores de todos os tipos em momentos críticos como esse. Os que se valem da oportunidade para majorar os preços dos estoques escondidos praticando crime contra a economia popular, ao extorquirem os consumidores indefesos. Nos dias de fúria, empresários do transporte calculam os ganhos obtidos pelo inegável sucesso do movimento.

Algumas lideranças dos caminhoneiros autônomos reportam a utilização do WhatsApp como instrumento de organização e mobilização do movimento, tal como sucedeu com as manifestações de rua do ano de 2013. Não há que se duvidar. Ao lado disso houve o apoio econômico dos empresários do ramo. Deu-se a mistura de greve com locaute. Algumas reivindicações de natureza corporativa, sem dúvida algumas justas.

Mas o inconcebível é o Poder Público, as autoridades governamentais serem apanhadas desprevenidas. Como responsáveis pelo bom funcionamento do sistema econômico e social, tinham que dispor de informações e de planos paralelos a fim de evitar os prejuízos sociais e financeiros decorrentes da paralização havida em todo o território nacional.  

Outros aproveitadores de ocasião apareceram com mirabolantes sugestões de ordem política, não se esquecendo que nos aproximamos das eleições de outubro, e como se sabe, não faltam salvadores da pátria. É sim, excelente oportunidade para os presidenciáveis declinarem os seus projetos para os meios de transporte. Se pretendem melhorar as rodovias, mas também se revitalizarão as alternativas ferroviária, marítima, hidroviária. A melhoria dos portos, das estações ferroviárias, rodoviárias, e das respectivas centrais de armazenamento. Isso de forma responsável do ponto de vista financeiro, sem mágicas e truques televisivos.

Em 1979, o diretor Carlos Diegues dirigiu um dos cem melhores filmes da cinemateca nacional, Bye, Bye Brasil. Tratava de uma Caravana Rolidei. Em cima de um caminhão cruzaram três artistas mambembes a Transamazônica até chegar a Altamira, para descobrirem que o Brasil que imaginavam não mais existia, e não se sabia qual seria o seu futuro.

Esse caminhão se identifica com o Brasil que continua na mesma. Agora, parece que caiu a última ficha, como diz a canção do mesmo nome.

 

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