29/01/2018

O Julgamento Do Ano

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Ninguém escapa da abordagem do julgamento da semana passada, em Porto Alegre, do recurso do ex-presidente Lula, condenado pelo Tribunal Federal da 4ª Região, a doze anos e 1 mês de prisão. A sentença se baseou em prova testemunhal e em documentos que indiretamente concluiriam pela culpa do recorrente. As análises situam-se em planos diversos: o político, o jurídico, o midiático, em todos eles, encontram-se partidários e adversários do ex-presidente da República.

As sentenças, embora o compromisso do processo judicial seja a busca da verdade, não necessariamente a encontram, e por via de consequência, a encerram. Mas em nome da segurança jurídica, a verdade processual provisória só pode ser refeita pelo trâmite recursal, até a última instância. O ex-presidente ainda não foi julgado pela o último Tribunal competente, e portanto, a verdade processual ainda não foi alcançada.

A repercussão de mídia justifica-se por se tratar de um líder político que por duas vezes elegeu-se Presidente da República, indicando a sucessora Dilma Rousseff, afastada do poder no segundo mandato por questionável processo de impeachment. Acrescido da sua condição de postulante ao mesmo cargo nas eleições de 2018.

A pergunta mais frequente: Lula poderá ser candidato neste pleito? A resposta é sim. Até a realização das eleições o seu processo ainda não terá sido julgado em última instância. Várias medidas judiciais poderão ser adotadas, visando suspender os efeitos da Lei da Ficha Limpa. Terão resultados favoráveis? Não importa. Elas conduzirão Lula a disputa.

A conveniência de sua postulação é de natureza política e deverá ser por ele avaliada em conjunto com os seus partidários. É próprio do regime democrático a convivência com a incerteza, embora muitos advoguem a unanimidade das decisões judiciais.

A questão da segurança jurídica relaciona-se a princípios, como o respeito ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido, a coisa julgada. Corifeus da pós-modernidade vêm defendendo a revogação dessas conquistas da civilização ocidental, em nome das mudanças produzidas pela revolução da tecnologia. Um bom juiz jamais será substituído por computador ou por robô, tratam-se de instrumentos a serviço do homem.

Nunca se viu antes um ex-presidente da República ser condenado a pena de reclusão sob a acusação de corrupção. A dádiva de prebendas para dirigentes públicos de parte de empreiteiros e de construtores é uma constante ao longo da história republicana. Nenhum deles por isso respondeu. Mudaram a compreensão e a interpretação desses procedimentos.

É inegável a mudança do padrão ético, mas também da doutrina processual penal nos dias atuais de hegemonia da mídia, incluindo-se as redes sociais.  Mas determinados preceitos não podem ser revogados ao talante das maiorias ou minorias dos colegiados judiciais.

Assim, em nome da segurança jurídica, enquanto o preceito constitucional não for revogado, ele terá que ser observado: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (artigo 5º, LVII, da Constituição Federal).

Diz-se transitada em julgado a decisão judicial de que não caiba nenhum recurso. Há, no caso do ex-presidente, uma pletora de recursos, não se podendo dizê-lo culpado até que se configure a “res judicata”. A decisão, tomada em maioria apertada, não é matematicamente aplicável a todos os casos. Ao Supremo, em cada situação, por se tratar de tribunal constitucional, cabe a última palavra. Além dos embargos de declaração, cabem recursos ao Superior Tribunal de Justiça-STJ, além da última fala do Supremo Tribunal Federal.

É esse o panorama jurídico, do ponto de vista processual. No plano político, fica evidente que a população brasileira, muito justificadamente está indignada com a corrupção, que não é monopólio de um determinado partido ou grupo, está entranhada na vida pública e na privada do país. Enfrenta-la não é privilégio da direita, a esquerda também deve fazê-lo.

Combate-la é tarefa do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Polícia Federal, e acima de tudo, dos cidadãos, os mais penalizados com a sua prática.  O acato ao Judiciário é indispensável a sobrevivência da democracia como forma de convivência política.

O julgamento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região é uma enciclopédia de lições para os profissionais do Direito e para os cidadãos. Não é por acaso que os meios de comunicação o rotulam como o julgamento do ano. Muitos ainda estão por vir.

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