01/10/2018

O Salvador da Pátria

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Decididamente, o Brasil não precisa de salvadores da pátria, venham de onde vierem, surjam de onde surgirem. O verdadeiro herói é o cidadão brasileiro, que com o seu suor, constrói o país em todos os rincões do território nacional. Aproxima-se o dia das eleições para a renovação de mandatos aos cargos do Executivo e do Legislativo, criados pela Carta Magna, completando 30 anos de vigência no próximo dia 5. O pais passara pelo jejum de mais de vinte anos de eleições diretas. Havia demanda reprimida de direitos políticos, sociais, negados à população, que seriam contemplados pelo legislador de 88.

Como antídoto ao autoritarismo, a Constituição estabeleceu o presidencialismo congressual, fazendo o Presidente da República depender de maioria parlamentar para a execução dos atos do governo. A consequência: nenhum presidente, governador ou prefeito poderá governar sem dispor de maioria nas casas legislativas. Logo, qualquer candidato que assuma compromissos sem levar em conta essa exigência político-jurídica, estará cometendo uma bravata e enganando o eleitorado. O diálogo com o Congresso e suas lideranças é essencial a governabilidade.

Nos trabalhos da Constituinte, e após a promulgação da Constituição, dirigentes da maior responsabilidade, dentre eles, o Presidente da República, asseguraram que com ela o país seria ingovernável. A previsão não se confirmou.  Enfrentou o impedimento de dois presidentes da República, sem a apelação para as intervenções castrenses, como era o costume anterior. Planos econômicos exitosos e fracassados foram executados em sua vigência, sem recorrência a medidas extremas.

Exercitou-se a democracia direta em consultas para confirmar a forma de Estado e de governo. Incorporou-se direitos novos ao ordenamento jurídico. Na área social, na proteção do meio ambiente, do consumidor, das crianças e adolescentes, dos idosos, das mulheres, das minorias étnicas e sexuais.

A Constituição afina-se com as mais modernas do mundo e as declarações universais de Direitos aprovadas pela maioria dos estados com assento na Organização das Nações Unidas-ONU. Um dos aspectos peculiares de sua estruturação é a enumeração dos Direitos antes da estruturação dos órgãos do Estado e de suas funções. Quis o legislador com isso dizer que os Direitos são anteriores ao Estado, e devem ser por ele ser respeitados, sob pena de incidência em flagrante ilegalidade. A norma é exigível de parte dos agentes públicos, os principais descumpridores.

Não obstante a sua modernidade, a forma de fazer política permanece arcaica, calcada no personalismo clientelista. A principal falha do legislador de 88 foi não fazer a Reforma Política desejada pelo povo desde os anos sessenta do século passado, quando em sinal de protesto elegiam-se animais do Jardim Zoológico, como o hipopótamo Cacareco, eleito vereador à Câmara Municipal, em São Paulo. Mais recentemente passou-se do Zoológico para o Circo com a eleição de palhaços.

Os partidos políticos não se consolidaram. A democracia partidária é uma ficção, gravitando a política em torno de nomes que controlam as máquinas partidárias. A organização partidária precisa refazer-se, considerando os novos meios de participação oferecidos pelas redes sociais. Elas que estão desempenhando papel fundamental nas eleições deste ano, e não as redes de televisão, como se supunha.

A fonte originária do poder político na Constituição de 88 é o cidadão, na formulação inicial vinda da Revolução Francesa de 1789, ampliada pelas declarações internacionais de Direito que o emanam do ser humano como realidade histórica e social. Daí dizer-se que a Constituição de 1988 é dos advogados, mas não só deles, dos juízes, dos membros do ministério público, de todos os que propugnam pela sua materialização nas instâncias do Estado.

A Constituição é perfeita? Não. Nenhuma delas atinge a perfeição. Disso sabia e tratava o sábio Aristóteles ao estudar mais de cem constituições da Grécia antiga, para concluir pela imperfeição de todas elas.

Tanto é verdade a assertiva que ela própria admite emendas e revisões do seu texto. Com a dependência do Presidente da República em relação ao Congresso, penso que as eleições parlamentares deveriam ser vinculadas, matéria para a imprescindível e inadiável Reforma Política.

Em relação ao pleito presidencial do dia 7, estimo que sem a presença onipotente dos marqueteiros, e do volume de dinheiro gasto anteriormente, e ainda a decisiva influência das redes sociais, é preciso ter cautela para com as pesquisas divulgadas. A vontade do eleitor poderá ser manifestada nas últimas horas anteriores as eleições. E salvador da pátria, só o Sassá Mutema, personagem da novela da Globo. Como dizia Brecht, infeliz a nação que precisa de heróis. 

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