01/11/2016

O ESPELHO DA ELEIÇÃO

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

A Associação dos Cientistas Sociais- Anpocs, reuniu-se semana passada em Caxambu, aprazível estação de águas situada em Minas Gerais, para examinar a situação política atravessada pelo país. Detectou a atual onda conservadora, sugerindo determinada saciedade de modernização de parte das elites dirigentes. O Congresso ocorreu dia 27, antes da realização do segundo turno das eleições municipais do último dia 30, cujos resultados confirmaram a tendência apontada pelos mestres e doutores, com o acréscimo da inédita reverberação entre as classes menos favorecidas.

A reverberação é uma forma de sutilmente dizer que os mais pobres estão apoiando as medidas de combate aos desvios dos recursos públicos envolvendo políticos, empresários e organizações partidárias. Assinale—se por fim que são envolvidos partidos de direita e de esquerda, mas como estes últimos estiveram no centro do poder em anos recentes, sofrem mais os desgastes das operações judiciais e policiais e das suas correspondentes delações. Anuncia-se para até o final do corrente mês a divulgação de mais uma delação bombástica, atingindo o Executivo, o Legislativo, e o espectro partidário mais à direita.

Os últimos acontecimentos envolvendo os poderes da República, a partir da Operação Métis, autorizada pelo juiz da 10ª Vara Federal de Brasília,  a fim de averiguar a existência de suposta organização criminosa, encravada na polícia do Senado Federal, com o fito de obstruir as investigações da Operação Lava Jato, demonstram que a crise de legitimidade sofrida pela chamada “classe política” reforça as instâncias do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal, que desfrutam do maciço apoio da opinião pública e da publicada. Os principais instrumentos da mídia repercutem os aplausos da sociedade ao combate da corrupção instalada nos organismos do Estado e das empresas contratantes, sobretudo das principais empreiteiras do país.

A criminalização da política se reflete claramente no espelho das eleições do segundo turno pelo elevado percentual de abstenção, de votos nulos e brancos, expressando a descrença da sociedade com o sistema eleitoral em vigor e com os partidos e candidatos.

As manifestações de rua deflagradas a partir de 2013 expressam claramente o descontentamento da população com as formas tradicionais de fazer a política e de manter o poder. Vem se formando ultimamente a consciência coletiva de que as pessoas custeiam o Estado que lhes deve serviços públicos de qualidade, especialmente nas áreas vitais da saúde, da educação, da segurança.

A classe política reluta em entender os sinais das ruas, fala da reforma política que nunca acontece, e parte para cosméticas alterações na legislação eleitoral que não ameaçam o poder que dispõem. Esquecem o velho adágio: “vão-se os anéis, fiquem os dedos”.

É oportuno lembrar as palavras de Ruy Barbosa quando se discutia as mudanças na Constituição republicana de 1891: façamos as reformas, senão o povo as fará com as próprias mãos.

A sociedade almeja a estabilidade política, deseja trabalhar e alcançar os objetivos de melhoria das condições sociais das pessoas, das famílias. A política deve ser instrumento do cumprimento dessas finalidades. O não cumprimento determina a abstenção, os votos nulos e brancos que crescem de eleição para eleição, atingindo partidos de direita e de esquerda. O desgaste maior destes últimos é atribuível a sua presença no centro do poder país na última década.  Não demorará muito e o desgaste será transferido aos partidos de direita.

A questão central no Brasil é que pelas as exigências de justiça social, da péssima distribuição da renda, ninguém quer assumir a condição de direitista, todos querem aparecer como democratas sociais. Trata-se de concepção falsa e maniqueísta.

Direita e esquerda são apenas caminhos para o mesmo fim: por o Estado a serviço da sociedade, e não o oposto disso, servir-se dele para fins privatísticos. O importante é a honestidade de propósitos. Após anos de República a sociedade brasileira não mais acredita em salvadores da pátria e messias. Quer assumir o próprio destino, isto é, quer ser a fonte real do poder político.

É isso que reflete o espelho da eleição do segundo turno. Quem tiver olhos que veja, quem tiver ouvidos que ouça a voz rouca das ruas. Que se façam as reformas permitindo a efetiva participação e representação da sociedade brasileira na condução das políticas do seu Estado. Senão o povo as fará com as próprias mãos, como advertia Ruy nos primórdios da República.

http://www.ericeiraadvogados.com.br/

 

 

 

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