12/04/2016

O MEDO AMEAÇA A ESPERANÇA

Autor: Carlos Nina

Ideologia e Religião

 

Ideologia e Religião são importantes para alimentar a mente e o espírito das pessoas e fortalecer a cultura da sociedade. Contudo, são instrumentos eficazes para seduzir incautos e os levar à radicalização e à violência. Por deformação intelectual, cultural ou moral, pessoas podem usar tanto a ideologia como a religião para induzir contingentes incalculáveis de indivíduos a praticar todo tipo de atrocidades. A história tem inúmeros exemplos disso. O momento nacional e mundial tem sido emblemático. Aí estão a intolerância religiosa promovendo o terror e assassinando inocentes, e a falácia ideológica seduzindo pessoas, para manter uma organização criminosa no poder. 

 

Refém do medo

 

Cooptados a soldo ou seduzidos pela mentira, segmentos da sociedade têm sido induzidos a materializar ameaças para tornar o povo brasileiro refém do medo.

 

Passivo e tolerante com a corrupção que viceja historicamente nas entranhas do Poder, o povo brasileiro não estava com medo quando elegeu aquele que prometeu acabar com a fome e a miséria. Apenas acreditou em suas promessas, tão ou mais falsas – se isso é possível – do que as dos demais demagogos que se apresentam a cada eleição.

 

Ressalvem-se os momentos históricos de repressão, quando o medo é um sentimento que nem pode ser negado, pela ostensividade ameaçadora dos regimes de exceção, uma vez que estes se caracterizam pelo uso impune dos mecanismos do Estado, neles incluídos o sequestro, a tortura e o assassinato, para perseguição a adversários políticos.

 

Esperança numa promessa

 

Consciente da lama sobre a qual repousavam os Poderes da República, a maioria da população acreditou numa organização partidária que surgiu  prometendo combater a corrupção, assegurar educação, saúde, e tudo o mais que todo cidadão de bem espera do Estado, direitos que sempre estiveram consignados em todas as Constituições brasileiras, expressamente, a partir do preâmbulo da Carta de 1934, e mantida na de 1988: o bem-estar de todos. As demais expressões são redundantes, porque o bem-estar pressupõe direitos sociais e individuais, liberdade, segurança, desenvolvimento, igualdade e justiça.

 

Um projeto de poder criminoso

 

O que poucos (só seus idealizadores) sabiam é que não se tratava de um projeto político com finalidade constitucional. Mas de criação de uma poderosa organização criminosa, inspirada em experiências históricas, cujos resultados foram desastrosos. Espertos (?), a bandidagem local tinha planos diferentes dos anunciados nas experiências nas quais se inspiraram. Isso partindo do pressuposto de que aquelas experiências tinham, efetivamente, projetos idealistas, e não os mesmos que de seus imitadores. De um modo ou de outro, apresentaram, ao final, o mesmo quadro de exploração do povo para manutenção de uma elite corrupta.

 

Lobo na pele de cordeiro

 

O projeto era a conquista do poder e sua manutenção, “democraticamente” sustentado num curral eleitoral de grandes proporções, à custa da exploração da miséria. Mas o discurso era de combate à corrupção.

 

Determinados, seus criadores souberam manter o discurso e persistir no projeto, durante anos, até que, catalisando o desejo de mudança da população, ansiosa para livrar-se da corrupção que minava os Poderes da República, foram alçados ao poder. E disseram: a esperança venceu o medo.

 

Que medo? Não havia medo. Havia esperança. E desconhecimento. Por isso muitos acreditaram. Enfim, dizia-se, um partido político em que acreditar! Alçado ao poder, acabaria com a corrupção. Vencida esta, o Legislativo produziria normas para melhorar a convivência social, o Executivo promoveria o bem-estar de todos e o Judiciário prolataria decisões justas.

 

O bolsa-família

 

O bolsa-família foi uma das primeiras estratégias. Sob o argumento de que seria uma forma de distribuir renda e estimular as famílias a educar seus filhos, era, na verdade, a institucionalização da compra de votos, prática criminosa que sobrevive nas eleições do País e foi, assim, legalizada, para ser paga, legalmente, com recursos do próprio contribuinte.

 

Aspiração de todos os necessitados e corruptos menos exigentes, o bolsa-família passou a ser, também, o temor da oposição. Bastava o discurso governista simplório de que os adversários iriam acabar com essa doação, para que seus beneficiários e os corruptos que dela se alimentavam decidissem votar nos candidatos do governo. Não importava mais nada.

 

Foram-se, então, identificando os segmentos da organização criminosa: seus criadores e beneficiários, seus “exércitos”, mantidos com verbas públicas, e os inocentes úteis, seduzidos pelo messianismo irresponsável da mentira e da farsa.

 

Aperfeiçoando a corrupção

 

Lentamente, no início, e aceleradamente, no final, a podridão começou a exalar o seu odor e ruiu o cenário, deixando nus os bastidores, onde foram flagrados os atores, na interpretação real e cínica de seus papéis de criminosos.

 

Mas isso não os intimidaria. Estavam dispostos a manter o poder a qualquer custo. Afinal, em vez de combater a corrupção, como prometeram, a aperfeiçoaram, expandiram-na,  elevaram-na a valores estratosféricos, até hoje ainda não totalmente avaliados. Não importava se, para isso, destruiriam a maior empresa nacional, porque não eram só corruptos piores, mas, também, profissionais incompetentes.

 

Vias da corrupção

 

Por isso não importava quanto custaria aumentar o número de ministérios e de cargos comissionados ou dar aos cargos de sua mordomia áulica status de ministério.  Era preciso criá-los para cooptar mais corruptos. Não importava quanto isso ia custar para a Nação. Da mesma forma que não interessava quanto custaria aos cofres públicos a montagem de esquemas com dirigentes igualmente corruptos de outros países, levando empreiteiros da mesma estirpe para construir obras que seriam financiadas por bancos brasileiros. Não bastava lavar dinheiro só no País. Montaram lavanderias em outros países, financiadas com dinheiro dos brasileiros.

 

Pedras no caminho

 

Mais do que no poema de Drummond, no caminho havia muitas pedras. A primeira delas foi a da ambição. Não aquela que já movia os agentes públicos e políticos da República. Mas o excesso. Era tão fácil meter a mão no dinheiro público que resolveram incrementar essa apropriação. Foi assim que o excesso de ambição de uma organização criminosa prestou um grande serviço ao País: pôs o povo cara a cara com a corrupção que mina todas as instituições da República e que tem sido empurrada com a barriga.

 

A avestruz tirou a cabeça do buraco. Não há como alguém dizer, agora, que não sabia. Só os incompetentes, corruptos e arbitrários dizem que não sabem de nada. Mas sabem que estão mentindo e que ninguém acredita neles. Apostam que ninguém fará nada com eles. É no que acreditam. E afrontam todos os Poderes e seus representantes. Insultam, acuam, intimidam todos eles. Exigem-lhes servidão. E os intimidados são compelidos a provar sua gratidão. E o fazem, com manifestações dúbias e decisões comprometidas. O chefe não pode ser tocado. Está acima da lei. Os acovardados, sim, mostraram que agem por medo, não por gratidão. Pelo menos admitem que devem seus cargos à “famiglia”.

 

Davi contra Golias

 

Na magistratura, as pedras de Drummond são pedregulhos. Um deles abriu o caminho para alimentar a esperança dos que acreditam na Justiça. O outro, com determinação, tem trabalhado como Davi para enfrentar os Golias que tentam, de todas as formas, garantir a impunidade.

 

Por último, atribuem-lhe erros, como se fossem crimes, e querem puni-lo, desviando o foco do verdadeiro crime que deu origem a tudo e que foi a destruição do Estado, o assalto aos cofres públicos, o uso dos recursos da população, tudo para ganhar uma eleição, manter-se no Poder e locupletar-se.

 

Eis aí presente e exposta a contradição. Punição por eventuais excessos de um magistrado, mas impunidade para a corrupção explícita, para o abuso de poder, para a ameaça e a intimidação aos agentes dos poderes da República e à obstrução da Justiça.

 

Que sejam punidos sim, com rigor, os excessos que tenham sido cometidos por qualquer magistrado. Mas, com não menor rigor os crimes de lavagem de dinheiro e de obstrução à justiça,  homicídio e uma farta lista que essa organização criminosa tem ofertado em sua trajetória.

 

Hipócritas

 

O que falta provar? Alguém tem dúvida de que as campanhas foram pagas com dinheiro de corrupção? Não. Não há dúvida. P. C. Farias, em depoimento no Congresso, já dissera que alegar a inexistência de Caixa 2, em todas as campanhas, era hipocrisia. E alguém duvida de que esse caixa ainda exista em todas as eleições e que vai sobreviver nas futuras? Por isso os eleitos tratam logo de encontrar meios de pagar seus financiadores, especialmente se são agiotas. Forjam contratos, suprimem ou fraudam licitações, qualquer miséria para pagar as despesas de campanha.

 

Essa é a realidade. Foi ela que essa organização criminosa expôs, como alguém espremendo o pus que o paciente sabe ter mas que tem medo da dor que o tratamento pode causar.

 

Talvez esse seja o único medo que a população tinha: o de ver o tamanho, a extensão, a profundidade da corrupção em que está mergulhado o País.

 

A quem entregar o Poder?

 

A dor moral pode ser pior que a física. O que o País está mostrando ao mundo? Que a corrupção é generalizada, endêmica, da qual ninguém escapa. Por isso é sintomático quando um magistrado diz-se indignado quando pergunta a si mesmo para quem entregar o poder, na hipótese de afastamento dos atuais dirigentes. Tem ele razão, se sua presunção é de que, “se gritar, ladrão!,  não fica um, meu irmão!”

 

O povo também se pergunta: e no Judiciário, em quem confiar? Por que um presidente da República pode chamar a todos de covardes, fazer ameaças à ordem pública, revelar suas tentativas de obstrução da Justiça e continuar livre, enquanto um senador da República, por muito menos, teve decretada sua prisão?

 

Quem parece ter medo não é o povo, mas aqueles que devem gratidão a quem tem o poder de, impunemente, incitar à luta fraticida, impunemente.

 

Mas têm medo de que? De perder seus cargos? Não são vitalícios? Ou, como diria Juruna, “têm o rabo preso”? Pela gratidão ou pela chantagem?

 

Guerra Civil

 

A população terá medo, sim, na guerra civil que esses irresponsáveis estão instigando. O que a população tem, hoje, ainda, é esperança. Quando a organização criminosa conquistou o poder, ninguém propôs uma reação armada. Era disso que eles, da organização, tinham medo, porque sabiam o que tinham planejado e pretendiam executar. Depois que se instalaram no poder, aí sim, passaram a construir uma estrutura para, esta sim, impor-se pelo medo, se tivessem ameaçada sua permanência no poder.

 

Chegou, para eles, a hora de dar essa mensagem, já anunciada não só pelo chefe da gangue, mas por seus porta-vozes, no comando de organizações paramilitares ou de ministérios. Todos, impunemente, prometendo cadáveres, em ameaça explícita, reforçada com o exemplo dos já produzidos desde o começo dessa trajetória criminosa.

 

Acabaram com a esperança do povo. Ameaçados de serem apeados do poder pelas vias democráticas, em razão dos crimes que cometeram, não aceitam as regras do jogo e ameaçam rompê-las.

 

Maria Aragão, comunista, já me dizia, nos idos de 1987 e 1988, em reuniões durante as campanhas da Constituinte, nas quais as decisões eram tomadas democraticamente: esse partido não respeita democracia. A democracia, para eles, só vale até onde coincide com a vontade deles.  O tempo mostrou que ela estava certa. 

 

Para eles, corruptos devem ser punidos. Desde que não sejam eles. Quando são pegos com a mão na botija e acusados, o fato vira perseguição,  injustiça, golpe.

 

Realidade comparada

 

Em alguns países os corruptos desmascarados se suicidam; em outros, são julgados, condenados e presos, ou executados. No Brasil, a corrupção, para sobreviver, mata. Quando a determinação da Justiça consegue julgar e punir alguns deles, é injustiça, perseguição. De qualquer modo, os mandantes e maiores beneficiários, esses não. Estão acima da lei e das instituições. Afrontam-nas e ameaçam a população. Confiam naqueles que seduziram, com dinheiro ou mentiras, e que estão dispostos a badernar, porque, na verdade, nunca lhes interessou o bem-estar de ninguém. Só o deles mesmos. E se para isso puderem estimular uma guerra fraticida, nada os deterá, porque, enfim, o que lhes interessa mesmo é a manutenção do poder, a qualquer custo. E apregoam isso, abertamente, como abertamente mostram para que servem ministérios e cargos públicos. Não é para executar as atividades inerentes às funções públicas. É para corromper, cooptar apoios para garantir a impunidade.  Isso com toda a desfaçatez!

 

Recorrer a quem, se até aquele que é o fiscal da lei e defensor da sociedade defende a nomeação de um corrupto para o Ministério como forma de viabilizar a governabilidade?

 

Sem benefício da dúvida

 

A ninguém mais é dado sequer o benefício da dúvida, porque não há mais segredo.  Ninguém no povo,  nem nos Poderes, pode dizer que não ouviu a voz rouca dos palavrões, dos insultos, dos deboches e das ameaças. As instituições públicas não se prestam mais a promover o bem-estar da população, mas para garantir a impunidade dos corruptos que dirigem o País.

 

Por isso Tânato tem a autoridade que os bastidores da corrupção lhes outorgam para chamar pelos nomes mais desonrosos dirigentes e membros das instituições da República. E todos parecem sucumbir ao comando de quem se anuncia como o verdadeiro dono do poder.

 

Tragédia, drama e comédia

 

O lado bom de toda essa tragédia social causada pela ambição dessa organização criminosa é que não há mais como negar que o País precisa de uma revolução em seus valores, nos valores que são manipulados pelos que detêm o poder, no Legislativo, no Executivo e no Judiciário.

 

O que o País está assistindo é um misto de tragédia, drama e comédia, que nem a reunião de Sófocles, Manoel Carlos e Moliére seria capaz de conceber, tamanha a miséria, o sofrimento e o deboche que vazam dos fatos.

 

A quebra do sigilo telefônico mais pornográfico já divulgado serviu como recado de alguém que estava insatisfeito com a ingratidão. O recado teve a eficácia de advertência para que seus vassalos mostrassem pronta gratidão.

 

Advocacia ultrajada

 

Nem mesmo aquela que por seu passado de lutas foi elevada a uma das instituições mais respeitadas da sociedade tem feito o dever de casa.  Por último, deixou-se ultrajar ao permitiu que em seu plenário o Advogado-Geral da União violasse o Código de Ética e o artigo  29 de seu Estatuto.

 

Como pode a instituição aceitar essa violação às definições constitucionais, se o seu primeiro dever, insculpido no art. 44 de seu Estatuto, é defender a Constituição?

 

A feira da Esplanada dos Ministérios

 

Com ministérios, cargos e recursos públicos, parlamentares vão-se vender mesmo. É da natureza da política que tem sido feita no País.

 

O presidente que foi afastado por causa de uma simples Elba, o foi porque desatendeu aos interesses dos parlamentares. Tânato, com ou sem ministério, está aí para fazer o contrário. Para fazer o que faz de melhor, que é corromper para vencer. Fará isso “democraticamente”. Afinal, depois de lavado, qualquer desvio de verba pode ser purificado. É a cínica justificativa que se ouve todos os dias, como um tapa na cara de cada brasileiro! Doações lícitas, declaradas à Justiça eleitoral e por estas aprovadas!

 

Mas se a estratégia não funcionar, a alternativa já foi anunciada: é guerra, invasão de propriedades e de órgãos públicos. Cadáveres!

 

O que merecemos

 

É isso o que merecemos por ter acreditado naquele discurso mentiroso, que matou a esperança nele inspirada e que agora explode como vômito podre das entranhas do mal,  disseminando o medo.

 

Quem fará Justiça?

 

Há esperança? Para o Judiciário, na voz de um de seus ministros, olhando para o Legislativo e para o Executivo, não há. E olhando para o Judiciário, há esperança?

 

 

 

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