29/08/2016

O MORDOMO E AS MORDOMIAS

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

O senador Antônio Carlos Magalhães-ACM teria apelidado o presidente Michel Temer de “Mordomo de Filme de Terror”, o próprio ACM foi alcunhado pelo general Golbery do Couto e Silva de “Toninho Malvadeza”. Posteriormente, transformou-se em “Toninho Ternura” em razão da sua adesão à candidatura de Tancredo Neves, no Colégio Eleitoral, possibilitando a transição que desaguou na convocação da Constituinte e na consequente promulgação da Constituição de 5 de outubro de 1988.

O pacto político-jurídico formalizado pela Constituição completará 28 anos de vigência, fato inédito na vida republicana brasileira, marcada pela pouca durabilidade das constituições e por interrupções autoritárias, danosas para a efetiva construção da democracia. Muitos políticos dela falam, sem, todavia, praticá-la. Começa pelo respeito e cumprimento das leis, que eles descumprem, imaginando-as exigíveis apenas em relação aos cidadãos. Enquanto as leis não forem para todos, o regime democrático não passará de um faz de conta, como tem sido ao longo da nossa história.

Há outras exigências. Basta examinar um aspecto da nossa vida pública para concluir como ainda estamos distantes de um real Estado Democrático de Direito. Trata-se das mordomias. Os detentores do poder estão acima do bem e do mal, ou seja, não se comportam como os cidadãos que deveriam representar. Não fazem suas compras nos supermercados, nos postos de gasolina, nas farmácias. Dispõem de empregados para tudo, seguranças, serviçais domésticos. As despesas são pagas pelo erário público. A regra se aplica aos Três Poderes da República.

Esquecendo-se de que a forma republicana de governo não é vitalícia nem hereditária, põem os filhos e parentes para sucedê-los nos cargos públicos. Utilizam os partidos onde instalam oligarquias controladoras, e como só se é candidato a partir da filiação partidária, os candidatos são os mesmos de sempre, integrantes da mesma família sanguínea ou grupal.

Quando se ingressa na vida pública dela não se quer mais sair. A finalidade não é servir a sociedade, mas dela servir-se. Transformam-se em profissionais da política, reelegem-se sucessivamente, não permitem alternativas de outras escolhas de parte da sociedade.

A sociedade brasileira vem crescendo em consciência política, percebe que as mordomias são pagas com as suas contribuições pelo pagamento dos impostos, que não são devolvidos em serviços públicos de qualidade prestados pelo Executivo, Legislativo e Judiciário. As manifestações de rua a partir de 2013 são provas cabais do hiato entre a classe política e a sociedade que deveriam representar.

A atividade política virou um balcão de negócios em que barganhar emendas, firmar acordos se impõe como condição para nela continuar. Trata-se de arrebanhar mais dinheiro para se manter na vida pública. Não importa como ou para que. Quando o dinheiro vira o maior objetivo da política, a corrupção cresce e envolve todos os órgãos públicos. Coexistem a pobreza de ideias e valores com a prosperidade nos negócios e o constante enriquecimento dos seus agentes.

Exemplo disso é ajuste fiscal convivendo com aumentos salariais de categorias corporativas. Como exigir sacrifícios da sociedade deferindo-se vantagens para as elites dirigentes de poderes da República.

No presidencialismo de coalização aqui praticado, a classe política concederá vantagens corporativas para continuar no poder, mantendo os privilégios de sempre. Aonde está a igualdade de todos perante as leis? A classe política é uma heresia sociológica, na verdade, os políticos deveriam representar todas as classes sociais. Sem a submissão das reivindicações corporativas ao interesse geral da sociedade não haverá democracia, por mais que dela se fale.

Os personagens sãos os de sempre, se revezam no governo ou na oposição, dependendo da oscilação do pêndulo do poder. No Judiciário, no Ministério Público, na Polícia Federal, com cargos providos mediante concursos públicos, há a novidade das novas gerações de profissionais, que manuseando legislação de influência norte-americana e europeia, levam a sério o preceito constitucional da igualdade perante as leis. Aí estão as prisões de políticos e empresários.

Na democracia ninguém está acima das leis. Seja presidente, governador, ministros, juízes, todos sujeitam-se ao império legal, exigindo o fim de privilégios, a exemplo do foro por prerrogativa de função. A vontade da sociedade deve manifestar-se nas urnas e nas ruas. A Constituição é clara: o poder político origina-se na cidadania, que está ciosa da preservação dos direitos sociais, incompatíveis com as mordomias. Os políticos devem ser os mordomos a serviço da população. E não o contrário, como infelizmente se vê. 

www.ericeiraadvogados.com.br

 

 

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