16/05/2016

WHATSAPP E CONSUMIDOR

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Durante 24 horas o aplicativo WhatsApp esteve fora do ar por determinação do juiz Marcel Montalvão, de Lagarto, interior de Sergipe. Em processo criminal, o magistrado requereu acesso irrestrito a conversas de texto, conversas de voz, vídeos e agenda de contatos de 36 usuários do aplicativo, fundamentando que o Marco Civil da Internet obriga as prestadoras a fornecerem a Justiça dados sobre os usuários em caso de cometimento de crimes. O objetivo: levar a empresa a liberar informações sobre quadrilha de traficantes responsável pela elevação da criminalidade na cidade sergipana. O bloqueio do aplicativo pelo juiz Montalvão em todo o território nacional provocou indiscutível caos social, a considerar que milhões de pessoas o utilizam para o trabalho, lazer, comunicações pessoais, familiares. Globalmente conta com um bilhão de usuários. Adquirido por Mark Zuckerger, proprietário do Facebook, por 22 bilhões de dólares, utilizado por enquanto gratuitamente, logo será empregado em operações bancárias, de seguros, e outras de natureza financeira e publicitária, retornando o valor do investimento em lucros extraordinários para a empresa.

Prestava entrevista ao apresentador Soares do quadro “Direito do Consumidor”, na TV Mirante, na terça-feira, dia 3 de maio, quando surgiu a indagação sobre a legalidade da decisão judicial e o prejuízo que acarretaria a milhões de usuários do aplicativo em todo o território nacional. Não é a primeira vez que isso ocorre, e a preocupação da empresa situa-se no plano da segurança, considerando o seu emprego em negócios futuros.

Uma das primeiras questões é se a decisão do juiz estadual sergipano não estaria violando o Direito Constitucional da comunicação do cidadão, além de prejudica-lo na condição de usuário, pois mesmo sendo o aplicativo grátis, o contrato de telefonia celular lhe proporciona a utilização do aplicativo, e no final, não há nada gratuito.

Seria o juiz de Lagarto competente para prolatar a decisão? No tocante a ação penal não resta dúvida, a extrapolação se restringiria ao bloqueio considerando sua repercussão além da jurisdição de Lagarto. A prosperar o entendimento outros juízes do interior de unidades federativas poderão repetir o feito. A repetição redundaria em enorme insegurança jurídica em setor vital das comunicações, estratégico para o comércio, o trabalho, e para o consumidor.

Associações de Defesa dos Consumidores poderão provocar o Supremo Tribunal Federal-STF para que decida a matéria, normatize as suas operações, de modo a impedir que juízes singulares repitam bloqueios, redundando em expressivos prejuízos a milhões de usuários em todo o território nacional.

O bloqueio do juiz deveria durar 72 horas. Foi suspenso em grau de recurso por desembargador do Tribunal de Justiça de Sergipe, que em sua decisão mencionou o caos provocado pela não utilização da ferramenta, ou seja, do aplicativo, arguindo ainda a impossibilidade da empresa fornecer as informações requeridas pelo juiz, por não dispor do número do celular em seu cadastro, e pela ferramenta utilizar o sistema de criptografia, impossibilitando o acesso ao conteúdo, a não ser aos participantes da conversa.

Outro desembargador negara recurso anterior, argumentando inclusive a minimização da investigação criminal de parte da empresa, levando em conta a sua importância para a comunidade de Lagarto em razão da sucessão de crimes relacionados com o tráfico de drogas, intranquilizando e ameaçando a paz pública.

O juiz Montalvão é tido como durão e comprometido com o seu ofício, fato comprovado pelo presidente da Subseção local da Ordem dos Advogados do Brasil, desmentindo as críticas de que desejava apenas aquele minuto de fama de que falava o norte-americano Andy Warhol, assim, a suspensão se fez para garantir o bem comum ameaçado pelo avanço da criminalidade. O mesmo bem comum que determinou a sua suspensão pela Segunda Instancia. Mas o juiz poderia adotar a multa como sanção.

É comum no mundo do Direito o conflito de valores. No caso, chocam-se os direitos de comunicação e consumo de milhões de pessoas, e igualmente o dever de combater o crime pelas autoridades de Lagarto, particularmente pelo meritíssimo juiz da Comarca, doutor Montalvão.

Compete aos órgãos de cúpula do Poder Judiciário evitar a repetição da situação, normatizando-a, evitando que milhões de pessoas sejam prejudicadas no exercício dos seus direitos. No restante do programa respondi a perguntas sobre cartões de crédito, planos de saúde e compras pela internet. Vivi, na prática, a atual realidade do mundo, dominado pelo consumo e pelas novas tecnologias.

 

http://www.ericeiraadvogados.com.br

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